quarta-feira, 28 de julho de 2010

:: Poltrona 33

Em co-autoria com D. S.

Eu estava lá, sentado no ônibus, esperando que o motorista desse partida em direção ao meu destino, quando a vi pela primeira vez. Era impossível não notá-la: Tinha a pele clara num corpo de deixar qualquer homem estarrecido; os cabelos loiros, compridos e fininhos que contrastavam de maneira assustadora com seus olhos negros grandes - de jabuticaba - como ela me contaria mais tarde. Trazia um brilho no olhar, que eu podia jurar que tudo ao meu redor se iluminou quando ela me fitou gentil e despretensiosamente. Em seguida ela me sorriu e pediu licença para passar e ocupar a poltrona ao lado da minha, a poltrona 33. Ela se ajeitou no assento um tanto enrolada e desajeitada, mas aquilo lhe deu um ar ainda mais juvenil e inocente, que eu não pude deixar de admirar. Num gesto delicado ela puxou seus cabelos pro lado, deixando exposta sua nuca frágil e mais branquinha ainda que o resto do seu corpo. Imediatamente um cheiro de lavanda e água fresca atingiu o ar, me fazendo pensar no próprio cheiro dos Deuses. Ela se recostou ali, com a cabeça inclinada virada pra janela, esboçando um sorriso leve olhando o ônibus deixar o terminal e partir. E eu me peguei imaginando o que ela tinha deixado para trás e o que a esperava lá na frente. Talvez só as suas preocupações tivessem ficado ali, junto daquele terminal. Porque o lá na frente, ninguém sabe ao certo o que encontrar.

À medida que o ônibus foi deixando a cidade, paisagens bucólicas foram ganhando a nossa janela, me trazendo à lembrança tantos momentos da minha infância passados na minha casa de praia. Do pão francês fresquinho de manhã trazido pela vó Maria; do bolo de cenoura com calda de chocolate dos fins de tarde da tia Tereza, dos gritos finos e escandalosos da minha mãe comemorando alguma coisa; dos campeonatos de vôlei à beira da piscina com meus primos, que sempre acabavam em discussões de quem errou mais e quem fez mais besteira; da nossa hotvale Mayla correndo atrás da bola feito uma maluca atrapalhando nossas brincadeiras. Me deu essa nostalgia gostosa que da na gente, de momentos que não voltam mais. Porque não existe mais a vó pra trazer o pão quentinho, nem os gritos da minha mãe porque agora ela se acha velha demais pra isso, porque a Mayla não está mais ali pra correr atrás da nossa bola e porque cada um de nós foi pro seu lado, cada um na sua desculpa de viver a vida e porque o tempo é curto e a vida corrida demais pra reunir tudo isso num só lugar de novo.

Eu estava ali olhando pra janela tão absorto nos meus pensamentos - escutando ao longe o som que vinha dos fones de ouvido dela que ouvia uma canção de Chico que falava que nada é pra já, que o amor pode esperar em silêncio. Que não me dei conta quando comecei a cantar a música em voz alta e ela riu da maneira mais gostosa com seus olhos apertados e transbordantes. Eu sorri de volta meio sem jeito de ter sido pego por ela, com meu coração vibrante de esperanças ao fitá-la. E eu não pude segurar meu ímpeto de falar sobre aqueles olhos que mais pareciam convidar a gente para descobrir o mundo. E a elogiei do jeito mais bobo e sem graça dizendo que ela tinha lindos olhos. Ainda com seu olhar fixo na janela, perdida nas suas próprias memórias, ela me respondeu – olhos de jabuticaba, era assim que meu avô me chamava. E ela me olhou e me sorriu despreocupadamente como se a alegria fosse um mero descuido do acaso. E ali naquelas dez palavras pronunciadas, que eu me apaixonei por ela pela primeira vez. Foi ali no silêncio de uma canção que os nossos segredos e olhares se encontraram pela primeira vez. Não foi preciso dizer muito mais depois. Naquele instante começava tudo.





Angels (Anjos) - Robbie Williams

Eu sento e espero
Um anjo contempla meu destino?
E eles conhecem
Os lugares onde nós vamos
Quando estamos grisalhos e velhos?
Pois me foi dito
Que a salvação deixa as asas deles estendidas
Então, quando eu estiver deitado na minha cama,
Pensamentos correndo pela minha cabeça,
E eu sinto que o amor está morto,
Estou amando anjos em vez disso...
E através disso tudo ela me oferece proteção,
Muito amor e afeição,
Esteja eu certo ou errado.
E debaixo da cachoeira,
Onde quer que isso possa me levar,
Eu sei que a vida não me arruinará.
Quando eu vier chamar ela não me abandonará.
Estou amando anjos em vez disso.. .
Quando estou me sentindo fraco
E minha dor caminha por uma rua de mão única,
Eu olho para cima
E sei que serei sempre abençoado com amor.
E conforme o sentimento cresce
Ela aspira carne nos meus ossos.
E quando o amor estiver morto,
Estou amando anjos em vez disso...

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